“Maldito é o cacete! Você já foi ao dicionário ver o que significa a palavra maldito?” Essa é a pergunta que Jards Macalé sempre faz quando algum jornalista se aproxima puxando esse assunto. Há algum tempo muitos artistas não se incomodavam e até se apropriavam da expressão, já que em determinado momento da história ser maldito ou marginal era até heróico. Mas, se levarmos ao pé da letra, nosso biografado tem razão de se aborrecer com a covarde alcunha a que foram submetidos ele e tantos outros contestadores da nossa música. Contestadores na forma, no conceito; artistas que não fizeram concessões, não subiram degrau por degrau a escadinha fácil do sucesso. E aí é fácil identificar Macalé, Jorge Mautner, Luiz Melodia, Walter Franco, Itamar Assumpção, Tom Zé, que em comum têm o fato de serem geniais, intuitivos, sensíveis, absurdamente criativos e, mais que tudo, autênticos. Maldito está lá no Aurélio: “Diz-se daquele ou daquilo a que se lançou maldição, condenado”; ou “Pernicioso, execrável, funesto”; e mais, “Muito mau, perverso, malvado, maligno”. Pesado, não? Mas tive a sorte de conhecer meu biografado longe das redações e dos holofotes, mais precisamente no Jardim Botânico, bairro onde fomos vizinhos por um tempo. Lembro que pedi para ele me dar umas aulas de violão, utomaticamente marcadas para o dia seguinte. Às 9h, conforme o combinado, eu estava lá. O porteiro interfonou e nada. Depois de muito insistir ele me mandou subir. Toquei a campainha e, passados alguns minutos, ouvi um barulho. Ele abriu a porta, pegou o violão e se despediu. Voltei para a casa de mãos abanando e sem aprender uma nota sequer. Mais tarde ele me ligou e disse que eu fosse la novamente. Quando cheguei encontrei meu violão na portaria com um bilhete: “Primeira aula. Trocar as cordas e limpar o seu violão que está um lixo. Como você quer que ele te dê um bom som?”.